
Por que a ERCA se cala perante actual tendência monopolista na imprensa?
Por: Carlos Alberto (Cidadão e Jornalista)
Já me tinha referido sobre os perigos – para o próprio titular do Poder Executivo João Lourenço, indicando que a actual Lei de Imprensa, a Lei n.°1/17, de 23 de Janeiro, dá ao Presidente da República João Lourenço o papel de jogador e árbitro ao mesmo tempo, ou seja, é ele que nomeia os Conselhos de Administração dos órgãos públicos de comunicação social e, por outro lado, é também ele o responsável máximo da regulação de conteúdos que o Executivo produz, mostrando que, no papel de regulador e supervisor de conteúdos divulgados nos órgãos públicos, nunca o titular do Poder Executivo vai aplicar uma multa à TPA, à RNA, ao Jornal de Angola ou à Angop, dando um tiro no próprio pé, porque foi ele que escolheu os seus responsáveis, retirando um espírito de gestão transparente de conteúdos e quebra de monopólios, uma ideia que vem também do próprio titular do Poder Executivo, nos seus discursos relacionados com a imprensa pública – de se ter concentrado no Executivo os órgãos de comunicação social que fizeram parte do grupo Media Nova, incluindo a TV Zimbo.
Chamei atenção, numa outra reflexão a respeito, sobre a possibilidade de ter havido falta de transparência (e mesmo uma possibilidade de violação à lei) da decisão da Procuradoria-Geral da República (PGR) em entregar directamente ao Executivo a gestão da TV Zimbo, Rádio Mais e jornal OPAÍS, como se os dinheiros públicos que serviram para a constituição de tais empresas pertencessem ao Executivo/MPLA, quando pertencem ao Estado angolano (todos os angolanos, de Cabinda ao Cunene).
No fim da semana passada, a PGR voltou a cometer o mesmo erro: entregou a Palanca TV e a Rádio Global à gestão do ministro das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, Manuel Homem, pelas mesmas razões que considerou no processo do grupo Media Nova e TV Zimbo: terem sido constituídas com dinheiro público.
O ministro Manuel Homem, por sua vez, engrossou, de acordo com a minha observação, ainda mais o erro inicial que teve no processo Media Nova: indicou/nomeou para estar à frente de tais órgãos administradores de órgãos públicos que já tinham sido nomeados pelo titular do Poder Executivo, o que mostra, claramente, uma violação à Lei de Imprensa no artigo 25.°, que diz “é proibida a concentração de empresas ou órgãos de comunicação social NUMA ÚNICA ENTIDADE, de modo a IMPEDIR A CONSTITUIÇÃO DE MONOPÓLIOS OU OLIGOPÓLIOS, pondo em causa A ISENÇÃO E O PLURALISMO DA INFORMAÇÃO E A SÃ CONCORRÊNCIA”.
Se, por um lado, me parece ser inquestionável ter havido ilegalidade na decisão da PGR em entregar, de forma directa, esses órgãos de comunicação social, construídos com dinheiro público, ao Executivo, por outro, a decisão do ministro Manuel Homem em escolher administradores da TPA e da RNA vem dar mais corpo à minha tese, já expressa noutra reflexão a respeito, segundo a qual o Presidente da República João Lourenço não está a perceber que o departamento ministerial responsável pela Comunicação Social está a agir contra os seus próprios discursos oficiais, que indicam pretender combater monopólios e oligopólios, incluindo na imprensa, algo que até mereceu “uma boa nota para a figura de João Lourenço em 2019” de olhares da comunidade internacional.
Outrossim, não se percebe por que razão o Conselho Directivo da Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana (ERCA), que tem a responsabilidade de garantir a inviolabilidade da Lei de Imprensa e da Constituição, perante isso, simplesmente fique num silêncio estranho, quando a Lei da ERCA lhe dá a possibilidade de se pronunciar publicamente a respeito.
Carlos Alberto (on facebook)
01.09.2020