
Prorrogação do Estado de Emergência em Angola: transformar um acto ilegal em legal
Por: Carlos Alberto (Cidadão e Jornalista)
A Assembleia Nacional convocou para amanhã, quinta-feira, 9, uma sessão plenária que visa analisar, como ponto único, a necessidade de se prorrogar o Estado de Emergência declarado pelo Presidente da República João Lourenço, doze dias depois de o Estado de Emergência em Angola ter começado de forma ilegal.
Vamos aos factos: o Presidente da República João Lourenço decretou no dia 27 de Março de 2020 o primeiro Estado de Emergência numa Angola multipartidária desde 1992, face à necessidade de prevenção e combate contra a Covid-19, com base numa prévia audição do Conselho da República, seguido de líderes parlamentares, no dia 25 de Março de 2020.
O Estado de Emergência (EE) começou, de acordo com o nosso ponto de vista, com uma inconstitucionalidade, na medida em que um EE só podia ser efectivado com um parecer da Assembleia Nacional, com base numa resolução.
As resoluções, na Assembleia Nacional, são obtidas em sessões plenárias e não em grupos restritos de trabalho, como diz o art.° 166.°, n.°2, al. f), conjugado com o art.° 161.°, al. h) da Constituição, que dizem que o Presidente da República só pode declarar estado de emergência ou estado de sítio mediante uma “autorização” (resolução) da Assembleia Nacional.
As resoluções, na Assembleia Nacional, são obtidas por deliberações – o mesmo que acontece na Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana (ERCA) -, que devem ter aprovação da maioria absoluta dos deputados (50%+1), como se pode confirmar no artigo 159.° da CRA (Constituição da República de Angola).
Não foi o que ocorreu na primeira declaração de Estado de Emergência (do dia 27, num momento em que as sessões plenárias da Assembleia Nacional estavam suspensas, mediante uma nota que circulou nas redes sociais e que até foi alvo do nosso Refrescamento de Português ao Domingo, devido à pandemia Covid-19).
Não houve, portanto, uma sessão plenária na Assembleia Nacional que deliberasse o Estado de Emergência. O que houve foi uma auscultação de alguns grupos de trabalho da Assembleia Nacional, o que constitui, do nosso ponto de vista, uma ilegalidade.
Estamos aqui a assumir que o nosso Estado de Emergência em vigor é derivado de um acto inconstitucional.
O Presidente da República João Lourenço violou a Constituição e nenhum jurista, nos comentários nos órgãos públicos de comunicação social, conseguiu assumir tal inconstitucionalidade, por razões já conhecidas (prevemos).
Para corrigir a ilegalidade actual, de acordo com a nossa análise, a Assembleia Nacional convocou para amanhã de manhã uma sessão plenária para que os deputados se pronunciem sobre a prorrogação ou não do Estado de Emergência, quando a decisão inicial não partiu de uma sessão plenária, mas de interesses de grupos da Assembleia Nacional.
Não sendo jurista (somos apenas um cidadão que gosta de reflectir coisas em voz alta nas redes sociais), ficamos com sérias dúvidas agora se os deputados (50%+1) podem votar (deliberar em resolução) amanhã para a continuação de uma ilegalidade (o Estado de Emergência actual), quando não foram eles que “autorizaram” o Presidente da República João Lourenço a fazê-lo.
Como ficamos?
Vamos transformar agora um acto ilegal em legal?
Carlos Alberto
08.04.2020